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AS TROVAS NUAS
Um homem que abandona uma mulher em condição de espera. Uma jovem que abandona o filho à madrugada, à morte. Um filho que abandona os pais à própria sorte. Um amigo que se esquece do outro e some, desaparece, sem deixar vestígios. Abandono, as trovas nuas da existência, persiste, a nos tirar o sono, a soluçar baixinho, quando todos dormem, e os dormentes não. Sós, essas trovas, ou pessoas, vão.
Abandono
As trovas nuas
21h01min
Abandono - as trovas nuas -,
tu acolhes minha sina
de astronauta sem as luas,
de lunático que ensina.
Meu amigo mais querido,
a quem tanto me apeguei,
desapega-se, escondido,
deste humilde que era rei.
A mulher, abandonada,
faz das horas seu tear:
tece a vida inanimada,
noite e dia, sem parar.
Olho o ingrato, pobre ser,
se descuida de onde sai;
mas o tempo vai vencer
e abandona quem se vai.
Ao criarem seus meninos,
pai e mãe envelheceram;
hoje, avós de pequeninos,
num asilo, "anoiteceram"...
Tua culpa, minha culpa,
triste ideia de exclusão;
prevalece a tal desculpa
de que fuga é solução.
Os "notáveis escritores",
as pessoas mais notáveis,
apontaram minhas dores
como causas insondáveis.
22h01min
Olivaldo Júnior
Mogi Guaçu, São Paulo, 23 de março de 2014.
Tentei vários caminhos para ser feliz. O Abandono seguiu-me a pé. Tomei um ônibus, um novo rumo, mas, cruel, o Abandono foi ágil: estava em cada um que me esperava.
Trovas sobre Abandono - Número Dois
Ao clarão da tarde quente,
te abandono e tenho medo:
quando chove só na gente,
nasce a lágrima em segredo.
O segredo do abandono
se revela ao sol mais pleno:
és verão, e sou outono,
neste inverno nada ameno.
Ao tomar de um violão,
tomo o bonde da esperança;
no abandono da estação,
estaciono em mim criança.
Uma casa de escritores
junto ao "rio guaçuano"
foi a causa dos amores
que cobri de desengano.
No divã da inconsciência,
entre Freud e o próprio eu,
peço a Deus a paciência
que o Abandono já comeu.
Meu amigo mais querido,
Baden Powell de ilusão,
fez-se em algo conhecido:
abandono e eterno não.
No sertão de minha vida,
vivo feito o Riobaldo:
só "veredas" dão guarida
para o rio do Olivaldo.
Olivaldo Júnior
Mogi Guaçu, São Paulo, seis e sete de abril de 2014.
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