segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

TROVAS EM DEBATE: DITONGOS E HIATOS # A. A. DE ASSIS - PR

(foto do autor)
A.A. de Assis
*&*
*&*
Antes, quero pedir desculpas ao Autor: Antonio Augusto de Assis. Mas uma polêmica dessa envergadura não pode ficar sendo repassada de amigo a amigo. Ela tem que ser levada  a público. Ele, que é um grande autor no mundo da trova, já foi vítima do "entendimento" de jurados em concursos. Imaginem os autores sem a destreza dele? Eu, cá do cantinha da minha humildade, fui acusado de "cochilar", "comer moscas", por causa de um encontro vocal do tipo abordado acima.
Com o devido respeito que A.A. de Assis merece, eu tomo a iniciativa de tornar pública essa polêmica.
Antonio Cabral Filho
*&*
TROVA EM DEBATE PROSSEGUE........


Posted: 22 Nov 2013 02:41 PM PST
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh7NBcVDsy82kFYoH1k0vW90XtFaO2T4MMYEkGLRzqwoOe8B6wPr4KaoWeUERJTMCD5_CpvLYyki4f_IZU68TUPv1Q-ZFYbnbw6OobmNpbYI5ssr1-ytWLcVBH_NsMNM7sTjr8XkMEcMQo/s200/Cantinho+do+Prof+Pedro+Mello.jpg
Em 2008, recebi das mãos de José Ouverney um livro que julgo significativo para a trovismo: “Trovas Brincantes II”, um livro a “oito mãos”, de A. A. de Assis, Edmar Japiassu Maia, José Fabiano e José Ouverney. Um quarteto fantástico... Entre as diversas trovas de humor que enfeixam o livro, três são merecedoras de um olhar mais atento por causa da criatividade:



Moderno, poupa viagem

o novo pombo-correio:
- Hoje ele manda a mensagem
numa boa, por email...
AA de Assis

Certo cupim se deu mal,pois um dia aconteceu:Era tão cara-de-pau,que outro cupim o comeu!José Ouverney

Sou moderno e bem arisco.Será que você não vê?Eu não tenho hérnia-de-disco,sofro é de hérnia-de-CD...José Fabiano

As três trovas em questão, assim como a trova do Bessant, à qual aludi no texto anterior, são de especial interesse por causa das rimas.

A. A. de Assis e o estrangeirismo bem-sucedido

A trova do Assis reflete algumas experiências que o autor tem feito no campo da linguagem, notadamente com o emprego bem-sucedido de anglicismos de uso corrente. Meses atrás escrevi sobre o uso da palavra “download”, e agora vemos a palavra “email”, que ele rimou com correio. Um efeito muito inteligente, até porque as palavras são de mesmo campo semântico, mas de línguas diferentes. O autor usa “email” do jeito como a palavra é empregada no Brasil: ipsis litteris, sem aportuguesamento e do modo como provavelmente se cristalizará no idioma.

A língua, no dizer de Ferdinand de Saussure, qualquer que seja, é arbitrária; não existe uma relação intrínseca entre a palavra e aquilo que ela designa. Nos estrangeirismos em Português essa arbitrariedade do signo linguístico fica bem evidente: há palavras que são aportuguesadas com bastante sucesso, como é o caso de “futebol” (foot ball), “abajur” (abat jour), “carnê” (carnet), buquê (bouquet), entre muitas outras. Outras, porém, permanecem com a grafia original: aids, air bag, bacon, blitz (germanismo) check in, marketing, pizza (italianismo), internet, email... Não existe uma “regra” para se aportuguesar ou não determinado estrangeirismo. Por isso que lembramos da afirmação de Saussure de que o signo é arbitrário.

Há quem vocifere contra o uso de estrangeirismos, mas esse é um fenômeno inevitável em qualquer língua: trata-se de um intercâmbio cultural inexorável. Isto que não quer dizer que não haja falta de bom-senso em letreiros de loja onde aparecem expressões do tipo “20 % off” por exemplo. Por que não “20 % de desconto”? Há estrangeirismos desnecessários e que constituem claramente vícios de linguagem, como o exemplo do “off” em anúncios de promoções em lojas. Entretanto, grande parte dos estrangeirismos se incorporam à lingua e tornam-se parte de um grande inventário aberto. Como vernaculizar “marketing” ou “pizza”? No caso de email, há o correspondente endereço eletrônico. As duas expressões existem paralelamente, mas em termos de comunicação é muito mais prático usar uma palavra simples de duas sílabas do que uma expressão composta de duas palavras. Não podemos nos esquecer de que a língua é dinâmica. O Assis, como um bom poeta, percebe essa plasticidade das palavras e brinca com elas a seu bel-prazer. Legítima a rima de “email” como “correio”. Ainda não é “concursável”, mas poderá ser em breve...

José Ouverney e a pronúncia brasileira do -l

O “l” é uma consoante alveolar, juntamente com o “n” e o “r”. Tais consoantes são assim chamadas porque são produzidas dentro da boca com a articulação da ponta frontal da língua com os alvéolos dentais (próximo à raiz dos dentes) na abóbada palatina.

No entanto, em final de palavras, o -l é vocalizado como -u. Isto quer dizer que -al soa como -au, -el, soa como -éu e -il soa como -iu. A trova do Ouverney, assim como a do Bessant, a que aludi no artigo anterior, soa de modo “brasileiro”!

José Fabiano e as consoantes sem vogal

A trova de José Fabiano também é muito interessante por causa do uso da palavra CD. Além de anglicismo, a palavra CD ainda foge da tradição por ser abreviatura e constituir-se, neste caso, de duas consoantes não acompanhadas de vogal.

Reza a tradição que “não existe sílaba sem vogal”. Realmente, não há sílaba sem vogal. Tecnicamente, então, CD não teria duas sílabas? Questão controversa, mas foneticamente perfeita: as vogais não estão escritas, mas são pronunciadas... cê-dê... não é assim? Já houve trova (não humorística) premiada que continha a palavra CD.

Fenômeno parecido com o da trova em questão é o suarabácti, um metaplasmo por permuta, no qual consoante muda em meio de palavra é pronunciada como se tivesse vogal. Alguns instintivamente contam tal consoante “muda” como uma sílaba. Não seria o caso de discutir o caso do suarabácti, condenado pelo nosso “decálogo de metrificação”? Embora a trova de José Fabiano não seja um exemplo de suarabácti, já vi trovas em que consoantes mudas são contadas como sílabas. Até porque foneticamente nenhuma consoante é muda. Querendo ou não, sempre pronunciamos uma vogal como apoio à consoante.

CONCLUSÃO

As línguas evoluem, assim como as sociedades que as usam. O Português evolui a passos céleres, e a trova, vez ou outra, documenta essa evolução. Os exemplos são de trovas humorísticas, gênero no qual as inovações ou licenças poéticas ocorrem com mais frequência. Isto não quer dizer que apenas o gênero humorístico “permita” inovações. A língua é uma só, independente do gênero da trova.

Fonte:

*&* 

Nenhum comentário:

Postar um comentário